E como fazer para ela ir embora?
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Envolta de travesseiros, enquanto
comia um chocolate, estava ela, ainda de pijamas, à escrever. Partículas do chocolate misturavam-se aos farelos de pão e biscoito, aos respingos de chá,
café, leite e aos lenços de papel espalhados pela cama. Com uma obsessão adolescente,
ela escrevia. Tinha plena consciência do Sol brilhando lá fora, pois sua luz
teimava em atravessar as frestas da janela; porém, queria permanecer para sempre
ali, quieta, em sua semiescuridão, escrevendo sobre sua dor e seus sonhos interrompidos.
A cama era grande, mas estava
vazia. Ela e os travesseiros não conseguiam preencher a saudade angustiosa e
indefinível que sentia. Poderia deitar-se em qualquer posição, ser a dona
daquele espaço, espalhar-se e alongar-se; no entanto, teimava em posicionar-se à
esquerda, como se esperasse que a vaga fosse milagrosamente preenchida.
Por várias vezes ela acreditou
que seria; em todas elas se enganou. Eles partiram, levando consigo os sonhos
que ela lhes impunha. Ao invés de amenizar-se, a dor da despedida fazia-se mais
mortal a cada nova vez que ocorria. Porque precisava depender de outro ser para
realizar seus desejos, queixava-se. Porque não poderia fazer sozinha, como tudo
que conquistara na vida? No fundo ela sabia a resposta: o fardo era pesado
demais. Natureza cruel.
Quando ela terminou de escrever e
seu coração já se encontrava apaziguado, era tarde, a manhã há muito havia
avançado. Ela queria que estivesse chovendo, que lá fora um vento frio e
deprimente rodopiasse pelas casas, como reflexo de sua alma
entristecida. Mas o Sol teimava em brilhar e penetrar insinuante pelas frestas.
“Como o amor”, pensou.
E no fim, estava decidida: iria
tentar outra vez.
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