quarta-feira, 4 de abril de 2018

Bombyx Mori Tupiniquim¹




       Naquele reino de personagens estranhos, “uma prostituta chamada Brasil se esqueceu de tomar a pílula e a barriga cresceu”.² Ela era uma vaca, de lindos cabelos verdes, onde toda fauna e toda flora se abrigava; seus olhos eram de um azul infinito, cristalino como as águas e como o céu. E de suas centenas de tetas escorriam leite e mel, que também saciava a fome de Povus, a quem ela servia.

       O problema era seu cafetão. Politicvs era um ser ardiloso, mesquinho e cruel. Ficou furioso quando Brasil engravidou, mas percebeu que, com sua gravidez, as tetas produziam mais. Brasil não quis se livrar dos próprios filhos e garantiu a Politicvs que eles iriam ajudá-la a cuidar de Povus. Sob esta promessa nasceram os trigêmeos Saúde, Educação e Cultura e com o leite da mãe cresciam bem. Até que Politicvs passou a exigir mais da sua parte, mas ficaria feio para ele reclamar na frente de Povus: então, na calada da noite, enquanto todos dormiam, drenava o leite de Brasil e este começou a faltar. Povus indignou-se com a falta de leite e Politicvs espalhou para quem quisesse ouvir que Brasil não estava cumprindo com seus deveres porque Povus não lhe dava as devidas recompensas.  Mas Brasil se esforçava em atender Povus, e os filhos dela a ajudavam, como prometido. E com Saúde, Educação e Cultura, Povus começou a se questionar sobre a real necessidade de ter Políticvs intermediando sua relação com Brasil. Assim, prevendo que deixaria literalmente de mamar nas tetas de Brasil, Políticvs lançou-se em um plano arriscado: sempre na calada da noite, tirou também o leite dos filhos de Brasil. Saúde e Educação foram os primeiros a definhar, enquanto Cultura resistia bravamente. Brasil continuava reservando igualmente suas parcelas de leite para seus filhos, que se revertia em prestação de serviços para Povus, mas enfraquecidos, o serviço das crianças era cada vez mais mal feito. Povus novamente procurou saber o que estava acontecendo e Politicvs prontamente respondeu: “Você não está recompensando Brasil suficiente, logo, falta leite para as crianças!”. “Mas cultura está bem!”, argumentou Povus, “É claro: é ele quem tira o leite dos outros irmãos! De quem você precisa mais? Vamos tirar o leite de Cultura e assim sobrará mais para os outros dois!”.

       O plano deu certo: Brasil continuava a distribuir igualmente o leite entre seus filhos, mas na calada da noite Politicvs tomava uma parte de Cultura para si e distribuía o restante para os outros dois irmãos. A melhora deles foi considerável, mas não suficiente. “Você precisa pagar mais pelos serviços de Brasil! Só assim vai melhorar! Esta mãe ingrata está deixando de produzir e a culpa é sua: pague mais! Pague mais!”, gritou Politicvs aos quatro cantos. Povus triplicou sua contribuição pelos serviços de Brasil, ela era tributado de todas as formas possíveis e inimagináveis – chegando a pagar para ter que trabalhar! Mas Brasil nunca via o retorno deste dinheiro: tudo era guardado nos bolsos, nas malas, nas calças e nas cuecas de Políticvs. O leite estava acabando. Saúde e Educação definhando, seu irmão mais velho, Cultura, há muito morrera de fome. Povus também enfraqueceu, não conseguia pensar. Só sabia esbravejar e brigar por coisas idiotas; não tinha forças para mais nada, convencido de que a culpa era de Brasil, aquela vaca ingrata que não servia para nada e daqueles que pensavam diferente dele.

       Vendo que a vaca ia para o brejo, Politicvs arrumou suas malas e foi para um paraíso fiscal qualquer, não sem antes deixar seus filhos de olho nela: enquanto a vaca desse uma gota de leite, ele queria a sua parte.
     
       E Povus, sem Saúde, Educação e Cultura, só sabia gritar: “Pátria que me Pariu!”³



¹Bombyx Mori é o nome cientifico do Bicho da Seda, que por sua vez é o título do segundo livro que J.K. Rowling escreveu sob o pseudônimo de Robert Galbraith. Nele, um detetive investiga a morte de um autor cujo livro (Bombyx Mori) retrata, de maneira pouco ortodoxa e cheia de analogias, várias personagens de sua vida real.
² e ³: Versos da música “Pátria que me pariu” de Gabriel, o Pensador.

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